Desenvolvedor: Pixel Punk
Em certos momentos, a expressão da brasilidade nos games se dá não pela evidência de temas nacionais ou valorização de nossas tradições e culturas, mas pela forma como enveredamos pela criação dos jogos inserindo elementos capazes de dar nova vida a recursos convencionais dos games, ampliando o escopo dos projetos, dinamizando a jogabilidade ou criando novas formas de curtir o gameplay, ainda que a essência da produção se baseie em modelos já consagrados. Nesse quesito, Unsighted é um exemplo seguro e atual de nossas particularidades no design de games e, por que não?, em nosso jeitinho brasileiro, que angaria elogios e admiração mundo afora.
“Unsighted é uma produção independente nacional que pode ser apresentada como uma mistura de RPG com ‘metroidvania’, com visão top-down, inspirado em Zelda e Metroid, em uma ambientação cyberpunk e trama de ação e mistério”, registrou o coautor Kao Tokio, logo no início da produção da criação das profissionais do estúdio Pixel Punk, em junho de 2018, quando o game estava sendo desenvolvido há cerca de quatro meses. Como descreveu o editor de conteúdo do site Drops de Jogos, à época, “[O game] já angaria a simpatia dos jogadores e boa receptividade entre os desenvolvedores, revigorando aspectos convencionais ao gênero e adicionando novidades”.
Baseando sua criação na mescla de projetos como Zelda, Metroid, Castlevania, Super Mario Bros. e Dark Souls, Tiani afirmou ao mesmo repórter, em nova entrevista concedida ao Drops de Jogos, em julho de 2018, que são muitas as referências em seu processo criativo, tornando o resultado uma bem dosada produção de referências múltiplas e um minucioso trabalho de composição deste mosaico criativo:
“Acho Undertale muito importante na questão de como apresentar uma história e como contextualizar mecânicas de gameplay sobre isso. Uma coisa que me influencia bastante é o Megaman, que tem todo um level design para ensinar o jogador e é uma coisa que eu tento usar no meu jogo”, informou a designer na conversa, à ocasião. “Megaman é uma aula de level design para ensinar o jogador sem parar o gameplay, através das próprias mecânicas”, declarou.
“Tem alguns aspectos mais técnicos do jogo, como o lance da física em 3D, que permite pular e tal, um diferencial nos jogos top-down, que não têm muito, e eu noto que o pessoal percebe”, afirmou. A mecânica de combate também foge aos preceitos dos primeiros games, e foi inspirada em trabalhos mais recentes, a exemplo de Dark Souls, exigindo um tempo maior para vencer os inimigos, a inclusão do recurso ‘estamina’, que ajuda a equilibrar os confrontos, e outras modalidades de jogos mais atuais”, completou a desenvolvedora na conversa com Tokio.
Embora o game seja econômico no roteiro, sua narrativa é complexa, bem construída e instigante para os jogadores. Resumidamente, a trama do game apresenta uma autômata protagonista que se vê em um ambiente infestado de robôs e máquinas, pesquisando os motivos da destruição do lugar e a morte de seus habitantes. “O jogo propositalmente não tem muitos diálogos e muito da narrativa é deixada para a interpretação do jogador”, detalhou Tiani.
“Sem adentrar o território de spoilers, a história de Unsighted é envolvente e extremamente bem escrita. Os personagens são encantadores, as conversas que você pode ter com eles são ora interessantes ou, então, tão naturais e sobre nada que parecem os bons papos furados da vida real”, opinou o articulista Bruno Yonezawa em análise do game para o site IGN Brasil, em outubro de 2021, sem esconder seu encantamento do o projeto: “Unsighted é um dos melhores jogos de 2021. O game indie traz uma releitura do gênero metroidvania com uma história envolvente e bem escrita, uma jogabilidade memorável, pixel art de ponta e muita atenção aos detalhes”.
A combinação equilibrada destes elementos que compõem a fina arte de um game design bem elaborado é um dos segredos do sucesso da criação do estúdio. “Você precisa ter algum diferencial, o que é difícil de conseguir”, comentou a criadora do jogo, dando continuidade ao papo com Tokio. “É preciso estudar muito e não depender apenas dos meios convencionais”, ponderou, explicando alguns aspectos mais técnicos de sua forma de produção:
“A nossa ideia é justamente fazer alguma coisa retrô, com pixel arte e tudo mais, mas indo além dos consoles antigos, com muitos frames de animação nos personagens; alguns têm 200 frames de animação, contra a média dos jogos antigos, que tinham 16 frames”, explicou, deixando claro o nível de complexidade da proposta para criar um game com visual atrativo para o público jovem. “A gente usa também muitas técnicas avançadas, tipo degradê, iluminação, shaders etc, que dão um ar mais moderno para a pixel arte”, relatou na conversa com o Drops de Jogos, acima comentada.
“Na lista de melhores do ano do site Polygon, um dos principais veículos dos EUA sobre games, Unsighted ficou em 10º lugar, à frente de títulos como Forza Horizon 5, Marvel’s Guardians of the Galaxy e Ratchet and Clank: Rift Apart, produzidos e distribuídos por algumas das maiores empresas do ramo”, escreveu o jornalista Gustavo Soares em uma longa reportagem sobre a criação do estúdio, publicada no jornal Folha de S. Paulo, em maio de 2022.
“Após o lançamento, Unsighted arrancou elogios de crítica e público”, destacou a repórter Jessica Pinheiro, em texto do site Tangerina, publicado em março de 2022. “Criado por duas mulheres trans, Tiani Pixel e Fernanda Dias, Unsighted foi um dos melhores títulos indies de 2021 e continua fazendo sucesso”, afirmou a profissional. “Completam as qualidades de Unsighted a ambientação futurista e melancólica, a trilha sonora inspirada em chiptune, jazz fusion e música eletrônica, e o visual em arte pixelada leve e espontânea”, conclui o artigo online: “Com a soma de fatores citados acima, não é à toa que Unsighted se tornou popular, com críticas positivas especialmente fora do Brasil”.
“O primeiro trabalho da desenvolvedora brasileira Studio Pixel Punk impressiona com seu mundo intrincado, jogabilidade ágil, muitas possibilidades na hora de resolver os desafios e vasto conteúdo. O resultado de tanto esmero é um jogo excepcional e muito divertido”, corroboram as impressões de Farley Santos, registradas no site Game Blast, em setembro de 2021. “Unsighted é uma aventura imperdível e uma ótima estreia do Studio Pixel Punk”, defende o autor do texto.
Compondo este vasto panorama de fãs do projeto, ninguém menos que o diretor de The Last of Us e copresidente da Naughty Dog, Neil Druckmann, teceu considerações mais do que elogiosas à obra da dupla de designers brasileiras, em uma publicação na sua conta do X, em dezembro de 2021: “Amando demais Unsighted! Ele parece nostálgico e moderno ao mesmo tempo. Mecânicas elegantes e precisas levam ele para outro patamar. Um dos melhores jogos desse ano”, redigiu.
“Unsighted é fantástico”, resumiu o avaliador Thiago de Alencar Moura, na primeira linha de sua análise do game para o site PSX Brasil, confirmando as impressões de Druckman e outros críticos, observando que, se 2021 tem sido um ano brilhante para títulos brasileiros “o produto lançado pela Studio Pixel Punk talvez seja o mais especial de todos”.
“Como é gostoso jogar algo primoroso que te dá vontade de nunca mais sair da frente do computador, né? E fica ainda melhor quando você descobre que o jogo é totalmente brasileiro, criado por duas minas fodas. Pois é. Unsighted foi esse jogo pra mim”, sentenciou Julia Macalossi em seu review do game, publicado em dezembro de 2021, no site The Enemy. “Posso confessar que metroidvania não é meu estilo favorito de jogo, mas Unsighted me ganhou em todos os pontos e detalhes”, afirmou, enfatizando que o game tinha “(quase) tudo que eu normalmente evito em um jogo [mas] é certamente um dos melhores jogos de 2021”.
O game foi indicado na categoria Melhor Jogo, no BIG Festival de 2018, perdendo para o indie polonês Frostpunk naquele ano, e também conquistou o prêmio de Melhor Game Nacional no CCXP Awards 2022.

Ficha Técnica
- Data de lançamento:
- Desenvolvedor:
- Dispositivo/Console: PC
- Gênero: Puzzle
- Número de jogadores: 1 jogador
- Este texto foi adaptado do artigo original sobre o game, presente no livro “Indie Brasilis: Catálogo de Games Nacionais – De Aventuras na Selva [1981] à sua versão mobile [2024]“, que deu origem a esse projeto.