Um dos aspectos mais envolventes dos primeiros anos dos computadores pessoais no Brasil reside no fato de o envolvimento dos entusiastas ‘micreiros’ ter-se convertido em uma grande usina de criação digital, com jovens talentos aprendendo a operar sistemas por todo o país, disseminando a cultura da insurgente informática e transformando paixões juvenis em sólidas carreiras para estes futuros profissionais.

Este certamente é o caso do projeto Cinco Estrelas, projeto realizado pelo programador Lisandro Granville, em 1987, então um universitário em Ciências da Computação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

O então estudante submeteu sua criação de entretenimento digital, produzida para o sistema MSX, à editoria de games da revista Micro Sistemas e recebeu a resposta na publicação da edição nº 92.

“Recebemos para avaliação, um adventure do leitor Lisandro Zambenedetti Granville, que se chama Cinco Estrelas. O jogo foi escrito em BASIC para MSX, e traz uma série de inovações em relação aos adventures mais tradicionais”, escreveu o então editor responsável pela seção de de jogos da revista, ninguém menos que o coautor deste livro, Renato Degiovani.

“[A Micro Sistemas] era uma revista de programação, a gente fazia questão de fazer uma seleção por edição das coisas mais diversas possíveis”, explicou Renato, em entrevista, já citada anteriormente neste livro, que foi realizada via YouTube com o também desenvolvedor e designer Dimitri Kozma, em abril de 2022. 

“Mas, obviamente, a maior quantidade que chegava era de [contribuições de] jogo, porque atingia todo mundo. Um programa de cálculo de vigas e pilares só serve pra quem é engenheiro civil [… mas, para] todo mundo que era usuário [o microcomputador] era um ‘eletrodoméstico pessoal’ e tinha essa questão do aprendizado, de você aprender a usar o computador digitando os programas e vendo como eles funcionam, [então,] a melhor coisa pra isso é o jogo, não tem a menor dúvida”, sentenciou o primeiro game designer do país, destacando os aspectos educativos já indicados no início deste capítulo.

Na resposta ao desenvolvedor do surpreendente adventure apresentado naquela edição da revista, publicada em maio daquele ano, o editor do periódico continuou com suas considerações muito elogiosas à produção:

“Totalmente gráfico, o ponto de vista do jogador foi deslocado para o topo das posições, ou seja, é como se o jogador visse a cena de cima. Este recurso simplifica muito o problema da representação gráfica das posições e permite que se escrevam jogos bastante complexos. Sem dúvida, uma ótima ideia”, ressaltou.

Outro ponto interessante, no entendimento do editor, foi a forma encontrada pelo criador do projeto para que o jogador comandasse o jogo, utilizando um recurso baseado em palavras pré-definidas.

“O Lisandro pede a nossa opinião sobre o seu trabalho e resolvemos publicá-la como incentivo para outros autores. O jogo é muito interessante e prende a atenção do jogador por bastante tempo”, defendeu Degiovani, enaltecendo as qualidades da produção.

“Todo trabalho gráfico foi muito bem elaborado, e a impressão que se tem é de que estamos diante de um produto pronto para ser lançado no mercado. O Lisandro está de parabéns e gostaríamos de analisar, muito em breve, o seu programa como manda o figurino”, finaliza o texto da revista.

Passados todos estes anos entre a colaboração do iniciante no design de games para MSX e o lançamento desta obra, os autores resolveram buscar através da internet referências acerca do jovem que teve um de seus primeiros trabalhos digitais reconhecido por uma revista de grande circulação no meio editorial brasileiro.

Foi com grata surpresa que nos deparamos com o fato de hoje, aquele jovem talento figurar como Professor Titular de Ciência da Computação no Instituto de Informática da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Brasil. 

O profissional ostenta um Ph.D. (2001) e um Mestrado (1998) em Ciência da Computação, ambos pelo mesmo instituto universitário, dentre outras qualificações.

O docente é também ex-presidente (2015-2019) e Conselheiro (2019-2023) da Sociedade Brasileira de Computação (SBC), currículo que corrobora a importância daqueles anos iniciais à frente dos códigos de programação para a produção de suas primeiras narrativas interativas.

Ficha Técnica

• Data de lançamento: 1987
• Publicadora: Micro Sistemas
• Dispositivo/Console: MSX
• Gênero: adventure 
• Número de jogadores: Um jogador